As surpresas da vida

Capítulo anterior: As lembranças da vida

Os dias se arrastavam numa lentidão impressionante. Os minutos pareciam horas. Eu estava acabado, nada mais fazia sentido para mim. Até parei de me coçar. Passava os dias recordando a minha vida de liberdade. Certo dia, lembrei-me dos inúmeros cachorros que conheci nas ruas. Pensei também naqueles que não tinham mais forças para viver.

 

Estava quase chegando ao ponto de acreditar que a vida não fazia sentindo, quando vi um par de pernas conhecidas passar pelo corredor. Ergui as orelhas, abri as narinas, levantei a cabeça e não acreditei quando vi o brilho daquele olhar. Senti um alívio só de sentir o cheiro daquele anjo no local. Era a moça da rua do meu território, a que sempre deixava um pouco de ração quando passava.

Levava um gato no colo. Mas passou reto, nem percebeu a minha presença. Fiquei triste, mas não por muito tempo. Quando ela voltou, vi seus olhos se encherem de luz ao me reconhecer. Então se agachou, olhou-me profundamente com ar de pena e surpresa e perguntou: “Peludinho, o que você está fazendo aqui?”

Ai, se eu soubesse responder.

A mulher pediu para uma das funcionárias do CZZ abrir a grade e me deixar sair. Fui lentamente em sua direção. Eu estava arrasado e fraco. Ela afagou minhas orelhas, me fez carinho e conversou comigo. Ela prometeu que iria me tirar dali. Eu acreditei. Ela se despediu de mim com um beijo na em cima da minha a cabeça, sem se importar com a minha sarna, e foi embora.

Tive uma esperança.

Naquela noite dormi mais feliz. Até comi. Estava contente de ter visto alguém amigo. Eu me sentia aliviado. Na manhã seguinte, nem acreditei quando ela voltou com uma coleira e uma máquina fotográfica. Não entendi exatamente o que estava acontecendo, mas estava mais animado.

– “Peludinho, vem cá.”

Eu fui. Ela me colocou a coleira e me levou passear. Demos algumas voltas naquelas ruas, para mim desconhecidas. Por isso, explorei os novos lugares. Cheirei cantinhos, graminhas e demarquei território. Quando menos esperava, já estávamos de novo na frente do CZZ. Com a câmera apontada para mim, ela apertou várias vezes o botão. Click, click, click. Não estava entendendo nada. Só sabia que aquela luz forte do flash me incomodava.

Achei que iria embora com ela, mas voltei para a jaula novamente. Fiquei deprimido outra vez. Não tinha a menor ideia, mas minha vida ainda tão curta estava prestes a mudar radicalmente outra vez.

No próximo capítulo: Precisa-se de um dono

Para acompanhar todos os capítulos da minha história, clique aqui. A ordem cronológica é de baixo para cima.

Até a próxima segunda.

Lambidas

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *