Crise reduz doações e instituições deixam de recolher animais abandonados

Ao atingir em cheio os bolsos dos consumidores e frear o consumo, a crise econômica também atingiu a causa animal. As doações para as organizações de Campinas (SP) que resgatam e cuidam de cães e gatos abandonados estão menores a cada dia e, em alguns casos, caíram pela metade, obrigando até mesmo a suspensão dos resgates de animais abandonados.

É o caso da ONG Amor de Bicho, que consegue resgatar e doar cerca de 20 animais por mês. Segundo Carol Pimenta, uma das voluntárias da organização, as dívidas atingiram R$ 30 mil e foi preciso parar com o acolhimento de animais. “Nós paramos de resgatar, e é uma coisa que a gente nunca fez. Realmente, agora é sério mesmo. Chegou um momento crítico que falamos ‘não dá mais’”, diz ela.

Custo elevado

Para manter o funcionamento da ONG são necessários cerca de R$ 20 mil por mês, dinheiro utilizado na manutenção de dezenas de animais em chácaras, hotéis ou lares temporários, vacinas, medicamentos e ração.

“Nosso custo mensal é alto, mas sempre conseguimos pagar com as doações. Além de terem diminuído as doações, estão surgindo casos em que os animais estão gravemente doentes. Não é só pegar um cachorro, fazer um hemograma e ver que está tudo bem, castrar, vacinar e pronto. Com a questão de crise no país, as doações diminuem drasticamente, caíram pela metade”, lamenta Carol.

Numa tentativa de diminuir as dívidas, a organização passou a vender produtos como camisetas, pulseiras, chaveiros, e organizando eventos. “São ações pontuais que nos rendem R$ 1 mil, R$ 1 mil e pouco, mas as dívidas estão muito maiores do que isso”, conta Carol.

Na ONG Focinho Abandonado, responsável pela doação de 1470 animais na cidade de Campinas desde a sua inauguração, em 2013, a situação não é diferente e também foi necessário suspender o resgate de animais, conta Aline Oliveira, representante da instituição.

“Cada dia temos novos pedidos de resgates, mas temos que negar. Não temos como resgatar, não temos como pagar. Se a gente doa um animal, a gente resgata outro. Porque não temos onde colocá-los, não temos lar temporário para eles. As doações diminuíram muito. Com essa crise, é a primeira coisa que as pessoas cortam. Elas param de ajudar ao outro”, diz Aline.

Segundo a protetora, as dividas da instituição também estão elevadas. “Temos muitas dívidas de hotel. Em um veterinário a dívida está R$ 8 mil, em outro, em R$ 1 mil. Fora os hotéis, que temos um custo mensal de mais ou menos R$ 2 mil. Estamos tendo que ficar com dívidas em veterinários, algo que nunca gostamos de fazer, mas não temos como pagar”, conta ela.

Problema crescente

Segundo estimativa da Organização Mundial da Saúde (OMS), com base no número de habitantes no município, Campinas possui hoje cerca de 20 mil cães e 10 mil gatos vivendo nas ruas. E este número tende a aumentar, avalia Carol. Na verdade, na percepção da protetora, o número de animais abandonados já vem aumentando. “Muito provavelmente por causa da crise que o país vem enfrentando. São cachorros que não estão sendo cuidados nem dentro de suas próprias casas”, conta ela.

A percepção é a mesma de Thaise Piculi, coordenadora de comunicações do Grupo de Apoio ao Animal de Rua (GAAR) de Campinas, que cuida de cerca de 40 animais, entre cães e gatos, e já conseguiu doar este ano 102 animais resgatados.

“Nossa situação não é diferente. O número de animais abandonados está aumentando e as doações estão diminuindo. A gente tinha uma média de gatos no ano passado, e este ano está superando. A situação dos animais abandonados, a gente tenta combater, mas infelizmente está complicado”, conta Thaise.

Segundo Thaise, por não possuir um local próprio para abrigar os animais, o ‘GAAR Campinas’ aluga uma chácara.

“Nosso custo chega a mais ou menos R$ 4 mil por mês, porque a gente banca tudo, desde hospedagem até ração, medicamentos, vacina, tudo”, conta ela.

Apesar disso, o ‘GAAR’ continua resgatando animais, mas, em certos casos, apenas os que exigem maiores necessidades. “A gente resgata os que estão em situação de risco, as cadelas prenhas, as cadelas com filhotes, os animais acidentados, os mais necessitados mesmo”, diz Thaise.

Um novo lar

Outro ponto em comum entre a maioria das instituições que cuidam de animais abandonados, é em relação à adoção. Toda pessoa que quer adotar um cão ou um gato passa por um processo de conhecimento com determinada organização, para quem está doando saber se a pessoa é realmente apta para cuidar do animal. E doar nem sempre é fácil, principalmente quando se trata de um animal adulto.

“As pessoas procuram muitos filhotes para adotar, e cachorros de portes pequenos. Cachorros de portes grandes e adultos demoram um pouco mais para serem doados”, conta Thaise Piculi.

Ela conta a história de Zulu, um cão adulto que está há muito tempo em sua ONG. “Estamos com um macho de porte médio para grande que está há quase dois anos para adoção e a gente não consegue doar, e estamos muito tristes. Ele é um cachorro muito bonito, muito brincalhão, mas, por ser um pouco grande, adulto, as pessoas têm um pouco de preconceito, e isso nos chateia”, lameta.

Neste ano, segundo a coordenadora de comunicação do ‘GAAR Campinas’, 102 animais já foram doados.

Contra a proliferação

Parte do protocolo adotado pelas instituições é a castração animal, que tem como principal objetivo acabar com os animais abandonados das cidades.

Segundo a veterinária Elani Garcia, além de diminuir o número de animais nas ruas, castrar um animal evita a transmissão de doenças também para os seres humanos. “Diminuindo a proliferação, diminui a quantidade de doenças, a transmissão da raiva por exemplo. Quanto menos animal perdido na rua, menor a incidência”, conta Elani.

Em determinadas ONGs, os animais são doados apenas após passarem por este processo. “A castração é o lema do GAAR Campinas. Nossos animais são doados castrados, tanto cachorro quanto gato. É um animal que não vai procriar, que não vai gerar outros abandonados, o animal não vai sofrer na rua”, conta Thaise.

ANDA

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