O pesadelo acabou
Capítulo anterior: O último dia no CZZ
O fim de semana passou se arrastando. Tinham sido, até então, os dois dias mais longos da minha vida. Mas terminou. Estava eufórico e não via a hora de me buscarem. Logo cedo, quando os plantonistas se preparavam para ir embora à medida que entravam os funcionários para cumprir mais uma jornada semanal de trabalho, mãe e filha chegaram para me buscar.
Quanta felicidade!
A promessa havia sido cumprida. Comecei pular esfuziantemente. Agora, teria um lar e uma família.
O portão verde se abriu – mal acreditava que seria a última vez que escutaria aqueles rodízios de ferro deslizando com dificuldade sobre o trilho enferrujado da jaula. Elas me chamaram, e eu fui, ágil como não era havia muito tempo. Parei na frente das minhas futuras donas e levantei a pata direita, como se estivesse cumprimentando. Costumo fazer esse gesto quando quero conquistar alguém. É uma graça que sei fazer. Os humanos gostam e, por isso, sempre dá muito certo.
Bel abriu um lindo sorriso, agachou-se e olhou dentro dos meus olhos. “Oscar, você é lindo”, disse ela. A mãe também ficou de cócoras e tirou a coleira de couro vermelha amarronzada com o número 056 escrito em um esparadrapo colado grudado nela. Colocou uma nova e me fez um cafuné. Fiquei com a Bel no corredor, desta vez do lado de fora das grades, enquanto a mãe foi preencher um formulário.
Depois de tudo resolvido, assinado e acertado, fomos para o carro, estacionado bem próximo. Fiz um xixi na árvore que havia na frente do CZZ de Guarujá para mostrar que havia passado por ali. Agora, eu era um cão livre e, melhor do que isso, teria uma família. Nunca mais passaria fome, sede, frio ou medo sozinho nos becos escuros das ruas sombrias do centro da cidade. Estava feliz demais.
Entrei no carro como um verdadeiro cão de raça, com elegância. Não estava com medo. Pelo contrário, sentia que não só estava deixando um lugar desagradável, mas confiava que me dirigia a um ambiente muito bom. O vento que agitava meus pelos vindo pela janela do carro em movimento era a melhor sensação do mundo. Não via a hora de conhecer minha nova casa.
Chegamos a um prédio alto em uma rua arborizada. Um portão automático se abriu, o carro entrou, estacionou e nós descemos dele. Comecei a ficar apreensivo. Nunca havia estado em um lugar como aquele. Não era uma casa. Era um lugar escuro, repletos de carros parados, um ao lado do outro. Bel segurava a minha coleira, e eu não andava mais com o rabo levantado e com a segurança que sentia quando deixamos o CCZ. Paramos em frente a uma porta de metal esquisita, com grades lembravam as jaulas de onde acabara de sair. Fiquei aterrorizado. O portão deslizou para o lado e passamos. Estávamos na rua novamente. Onde estava a casa? Para onde estavam me levando desta vez?
No próximo capítulo: O mundo doméstico
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Até a próxima segunda.
Lambidas.