Giárdia em cães

filhotA giardíase é uma doença causada pelo protozoário G. intestinalis (também conhecido por G lamblia ou G duodenalis) e hoje é considerada a doença protozoal entérica (intestinal) clinicamente mais preocupante em cães. Este parasita intestinal além de ser responsável por causar danos à saúde dos animais (cão, gato, gado, roedores, entre outros), pode eventualmente infectar o homem. Popularmente a giardíase também é conhecida como Enterite por Giárdia, Gastrenterite por Giárdia, Duodenite por Giárdia, Lambliose ou Giardose.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) considerou a giardíase uma zoonose em 1979, por apresentar baixa especificidade pelos hospedeiros. Atualmente são reconhecidas cinco espécies de giárdias que acometem animais e o homem: G. duodenalis (intestinalis), G.agilis, G. muris, G. ardeae, e G. psittaci. Resumindo, há giárdias de genótipos específicos para determinado hospedeiro e giárdias de genótipo comum à humanos e à vários animais, os chamados genótipos zoonóticos.

O homem e os animais têm contribuído para o aumento da infecção em áreas populosas. Atualmente, a recorrente presença de cães nas áreas urbanas expõe a população à contaminações ambientais e à doenças pelo contato direto ou indireto com animais infectados, incluindo a giardíase e outras parasitoses.

A giardíase tem sido uma das principais causas de doença nos animais domésticos, constituindo-se um problema relativamente comum na clínica médica de pequenos animais. Apesar do uso frequente de vermífugos, o problema é visto diariamente em consultórios, clínicas e hospitais veterinários.

Transmissão

Os cães são infectados a partir da ingestão de água e/ou alimentos contaminados com cistos oriundos das fezes de outro indivíduo doente (conhecida como transmissão indireta).

O risco da infecção por giárdia é acentuado com a alta densidade populacional, falta de higiene e certos hábitos alimentares. Cerca de 10 cistos levam a infecções. Suas taxas são altas em áreas de grande população humana e animal, devido ao aumento da oportunidade de transmissão de forma direta ou indireta. É possível haver transmissão direta (contato entre indivíduos contaminados), principalmente em locais onde os animais encontram-se aglomerados, como gatis e canis.

O cisto (forma infectante) é capaz de sobreviver durante meses em ambiente úmido, porém os cistos são inativados pela maioria dos compostos de amônio quaternário, água sanitária, vapor e água fervente. Após serem ingeridos pelos cães, transformam-se em trofozoítos que é a forma causadora da doença. Já no intestino do animal, esse parasita adere ao epitélio intestinal, não apresentando capacidade invasora ou destrutiva direta.

A susceptibilidade a contrair a doença aumenta quando houve transferência inadequada de imunidade materna, doença concorrente, estresse ou nutrição inadequada. Essas observações indicam que a giárdia é um parasita que pode ser facilmente transmitido entre as espécies animais e que animais infectados podem desempenhar o papel de reservatórios para humanos.

As deflagrações da doença em proporções epidêmicas têm sido, na maioria das vezes, atribuída à transmissão pela água, pois sua contaminação com efluentes humanos e com fezes de animal infectado pode levar a infecções amplamente disseminadas, tanto em humanos quanto em animais.

Uma vez que os cistos da giárdia podem sobreviver em água por vários meses, a fonte de contaminação é muitas vezes difícil de ser determinada. Contudo, as fezes dos animais, tais como cães, bovinos, ovinos, cavalos e suínos, representam um grande potencial para contaminação da água e dos alimentos, carecendo de medidas de saneamento cada vez mais intensivas.

Dados epidemiológicos

A giardíase acomete mais frequentemente animais jovens (de até um ano), dos quais 26-50% são infectados. Quando estes animais vivem em grupos, como por exemplo, em casas em que vivem diversos animais ou canis, 100% deles podem chegar a estar infectados, não havendo predileção quanto ao sexo e tanto fêmeas quanto machos são acometidos.

Sua importância epidemiológica se deve ao fato de possuir potencial zoonótico e pela apresentação sub clinica da doença, onde não há sintomatologia, porém há disseminação dos cistos via fecal.

Sinais clínicos

Apesar das infecções sintomáticas serem comuns em animais jovens em sua maioria as infecções por Giardia spp são assintomáticas nos adultos. O período de incubação varia entre 9-15 dias após a ingestão do cisto, e a fase aguda dura 3-4 dias.

A infecção leva a quadros de diarreia intermitente comprometendo a digestão e a absorção de alimentos, levando a desidratação perda de peso e até mesmo ao óbito. Comumente as fezes são pálidas, fétidas e moles, podendo apresentar-se na forma aquosa ou hemorrágica, quando contém vestígios de sangue. Porém, fatores como cepa do parasita, tempo de infecção, dieta e imunidade influenciam na sintomatologia da doença.

Os distúrbios gastrointestinais podem se apresentar de forma aguda e progressiva, como anorexia, náuseas, vômitos, dor abdominal e diarreia aquosa sem febre. A maioria dos animais se recupera da giardíase aguda, mas alguns podem sofrer com diarreias crônicas causadas pela giárdia que persistem dois anos ou mais.

Os sintomas nos seres humanos são de ordem intestinal, aparecendo entre uma e duas semanas após a infecção, podendo durar de duas a seis semanas ou mais tempo. Neste período pode-se observar diarreia, presença de gases e flatulência, dores abdominais e náuseas. A aparência das fezes pode ser oleosa e tendem a boiar na água. Pode ocasionar perda de peso e desidratação. Algumas pessoas com giardíase não apresentam nenhum sintoma.

Diagnóstico

O exame clínico convencional pode levantar suspeitas da doença, principalmente diante dos relatos feitos pelo proprietário do animal. Contudo, o método diagnóstico utilizado atualmente é a identificação dos cistos na avaliação fecal, ou seja, através de exame laboratorial das fezes do animal.

Vale ressaltar que, segundo a literatura, a detecção de cistos nas fezes só é possível entre um e sete dias após o inicio dos sintomas. O exame seriado, aquele repetido mesmo ao dar negativo, aumenta a sensibilidade do exame, a qual passa de 70% quando avaliada única amostra para 95% quando analisadas três amostras distintas. Trofozoítos raramente são visualizados, pois no intestino delgado sofrem alterações morfológicas que os possibilita aderir à mucosa intestinal por mecanismo de sucção. A formação da giárdia em forma de cisto ocorre quando o parasita transita pelo cólon, e é nessa forma então que os cistos são encontrados nas fezes e são infectantes.

O método preferível para visualizar os cistos nas fezes é o da flutuação em solução de sulfato de zinco. Entretanto, alguns autores consideram este método inadequado, pois os cistos não são facilmente visualizados em meio aos detritos fecais.

Assim, técnicas de imunodiagnóstico foram desenvolvidas para detecção de antígeno nas fezes por meio de imunoensaio enzimático (ELISA). Este método, apesar de mais dispendioso do que a procura de cistos nas fezes, apresenta maior sensibilidade e especificidade. A detecção de antígenos fecais por PCR das fezes também pode ser realizado, porém é uma técnica de custo elevado.

Tratamento

O medicamento mais utilizado para o tratamento da giardíase em cães é o metronidazol, na dose de 50mg/kg/dia. É relativamente seguro, eficaz, porém não deve ser administrado em gestantes, pois atravessa a barreira placentária.

Anti-helmínticos como o albendazol também mostram ser seguros e eficazes, sendo 100% eficaz na dose de 25mg/kg VO, BID para quatro doses. A furazolina também pode ser utilizada especialmente para filhotes que não toleram nitroimidazóis. Medidas de higiene no local de acesso dos animais fazem parte do tratamento e são fundamentais e indispensáveis, a fim de evitar reinfecções.

Frequentemente, a terapia de suporte deve ser instituída, que inclui a fluidoterapia, modificação alimentar, antieméticos e agentes protetores gástricos, a fim de acabar com os sinais clínicos secundários à infecção intestinal. No entanto, nos casos mais graves, a descompensação aguda pode ocorrer secundária à depleção de volume, perda de fluído e distúrbio ácido básico que ocorrem devido ao trato gastrointestinal ser incapaz de desempenhar suas funções hemostáticas normais. Nesses casos deve ser instituída terapia agressiva, com internamento e intensivismo até a resolução da doença e das consequências geradas por ela.

Controle e prevenção

Ações de educação sanitária devem ser implementadas, objetivando a adoção de hábitos de higiene específicos e diminuir a transmissão fecal-oral, torna-se importante melhorar a qualidade da água e lavar bem as mãos e alimentos antes das refeições. A eliminação de insetos vetores, como moscas e baratas, contribui para a solução do problema. A orientação do paciente quanto ao controle parasitológico dos animais de estimação existentes na casa, sob supervisão de um médico veterinário, também é fundamental. O ambiente do animal deve ser descontaminado. A ação de solução de amônia quaternária por 30 a 40 minutos pode ser utilizada para essa desinfecção.

Nesse sentido, a vacinação de cães contra a giardíase pode ser recomendada como medida profilática, já que a vacina reduz eficazmente a incidência, a severidade e a duração da eliminação de cistos. A vacina pode ser aplicada a partir do 56º dia de vida, sendo ineficaz para cães já infectados. A segunda dose da vacina pode ser feita 14 a 28 dias após a primeira e a revacinação é anual. Vale ressaltar que o animal só torna-se imunizado 15 dias após a aplicação da segunda dose da vacina.

Texto retirado: Cães e gatos

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