Esse não é o animal

A morte brutal da cadela Manchinha no estacionamento do supermercado Carrefour, em Osasco, na Grande São Paulo, poderia ter sido só mais um dos inúmeros episódios de maus tratos contra animais a passar impunes no Brasil. Não foi assim. A crueldade do ato causou comoção nas redes sociais, mobilizou celebridades e atingiu a imagem da rede varejista, que promove o compromisso do bem-estar animal entre seus fornecedores de carne e estimula a criação sustentável de bezerros e de galinhas. Enquanto isso, descobriu-se que os cachorros são mal tratados por ali. Manchinha circulava pelo estacionamento há vários dias, mas não era bem vinda. Câmeras registraram as cenas em que, finalmente, um segurança bate nela com uma barra de alumínio. O animal é perseguido e começa a sangrar. “As imagens são claras e sabemos também que a cadela também foi envenenada e capturada por funcionários da Prefeitura com violência desproporcional”, diz a ativista Luisa Mell, que dirige uma ONG de proteção aos animais e divulgou as cenas do crime no Instagram. “O que esperamos agora é que essa cadelinha morta se transforme numa espécie de mártir contra esse tipo de abuso”.

Covardia humana

As consequências do ataque a Manchinha apareceram rápido. Na segunda-feira 3, um inquérito foi aberto na delegacia de Osasco. Um representante do departamento de Fauna e Bem-estar animal da Prefeitura fez a denúncia e solicitou a investigação da morte do cão. No boletim de ocorrência consta que Manchinha foi socorrida por agentes da Prefeitura e teve uma parada cardíaca. Ao mesmo tempo, dois processos estão sendo abertos por iniciativa da Associação de Advogados Criminalistas de São Paulo. O primeiro por danos morais coletivos contra o Carrefour e outro criminal, contra o funcionário, que não teve seu nome identificado. O Ministério Público também abriu uma investigação. “Esse tipo de coisa acontece todo dia, mas as pessoas não denunciam”, diz Carolina Mourão, presidente da Confederação Brasileira de Defesa Animal. “A lei é branda é há um grande campo de impunidade”.

Neste sábado está previsto um ato público na frente da loja do Carrefour em Osasco. Os organizadores da manifestação, que esperam reunir mais de mil pessoas, falam em boicote à rede e no endurecimento da lei. O artigo 32 da lei de crimes ambientais prevê pena de três meses a um ano de prisão, além de multa, para quem praticar ato de abuso, maus tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos. Na prática, esses crimes são considerados de baixo potencial ofensivo e as penas se limitam ao pagamento de cestas básicas. O segurança que atacou Manchinha será indiciado, mas dificilmente preso. Na quarta-feira 6, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) apresentou um projeto de lei em que eleva a pena de maus tratos para até três anos de prisão.

A repercussão nas redes sociais

“Existe uma epidemia de crueldade no Brasil e a morte dessa cadela é um sintoma de desajuste social”, afirma a advogada Antília da Monteira Reis, presidente da Comissão de Proteção de Defesa Animal da OAB de São Bernardo do Campo (SP). A morte de Manchinha mobilizou celebridades, como o apresentador Luciano Huck, que usou suas mídias sociais para denunciar a crueldade, e as atrizes Tata Werneck e Alexia Dechamps. O Carrefour divulgou nota na qual reconheceu que um grave problema ocorreu na loja de Osasco e declarou que não irá se eximir de sua responsabilidade.

“Estamos tristes com a morte desse animal. Somos os maiores interessados para que todos os fatos sejam esclarecidos”, informou a nota. “Por isso, aguardamos que as autoridades concluam rapidamente as investigações”. Desde o início da apuração, o funcionário de empresa terceirizada que agrediu Manchinha foi afastado. A rede informou que “ONGs ligadas à causa animal vão nos auxiliar na construção de uma nova política para a proteção e defesa dos animais”. Os fatos recentes indicam que isso é realmente necessário.

Retirado de Istoé

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